2 de maio de 2014

OS GRANDES JOGOS COMO FORMA DE DIVULGAÇÃO INTERNA DO RUGBY *

* Paul Tait
Depois de ganhar o Campeonato do Mundo de 2003 a seleção inglesa estava numa posição única - o rugby estava preparado para uma enorme expansão e para se tornar o desporto mais poderoso e popular do país.

A população inglesa estava disponível para ser conquistada, mas a política da RFU negligenciou a oportunidade, já que a federação de rugby mais rica do mundo falhou ao se recusar a disputar qualquer jogo fora de Twickenham, e a a decisão de manter a selecção inglesa a disputar todas as suas partidas no Twickenham Stadium em Londres, mantém-se. 

A situação é esta até agora, apenas um ano antes de sediar o Campeonato do Mundo de 2015.


A posição da RFU mostra claramente que o rugby vem no segundo lugar. 
A prioridade é para maximizar lucros. 
No fim a RFU é uma empresa mas está tão concentrada nos aspectos económicos que o desporto não conseguiu chegar nem perto de onde poderia ter chegado.
As prioridades da federação mais rica do mundo não deixou o desporto crescer dentro do país e a seleção também caiu para ser atualmente notavelmente inferior ao que foi em 2003 e está longe de ser considerada comparável às duas melhores.

Desde 2003 as oportunidades foram desbaratadas ou até ignoradas já que nenhum encontro internacional foi disputado fora de Londres, as meias finais do Aviva Premiership não foram disputadas em grandes estádios através da Inglaterra e o campeonato caiu para, atualmente, ser menos poderoso e rico que o Top-14. 
A ascensão do Top-14, tornando-se a competição mais rica no mundo, foi auxiliada significativamente pelas políticas adoptadas em França pela Federação Francesa de Rugby e pela Ligue Nationale de Rugby.

A França jogou partidas internacionais em vários estádios antes e depois do Munidal de 2007. 
A França recebeu o Canadá em Nantes dois anos antes do Canadá enfrentar o País de Gales no mesmo estádio. 
Lyon recebeu o França-Nova Zelândia em 2006 e os All Blacks enfrentaram Portugal no mesmo estádio no Mundial. 
A França enfrentou a Argentina em Marselha em 2004 e 55.000 pessoas estavam no estádio para assistir aos Pumas-Namíbia em 2007.

Não existem exemplos comparáveis na Inglaterra e nada irá acontecer antes do início do Campeonato do Mundo em Setembro de 2015. 
A consequência nos jogos entre clubes no país é que as meias finais da Heineken Cup não estão tão vendáveis como os jogos na França ou na Irlanda. 
De facto a meia final Saracens-Clermont, do sábado passado, tanto como a meia final Saracens-Toulon do ano passado, foi um desastre.

O Saracens conseguiu realizar jogos no Wembley Stadium com sucesso, mas isso sempre aconteceu com o clube tendo muito tempo para organizar uma campanha de marketing complexa. 
Em curtos prazos o clube não consegue organizar um jogo como a meia final sábado passado. 
O Diretor Executivo do Saracens, Edward Griffiths, comentou que se o jogo fosse num estádio menor como o Allianz Park ou o Stade Marcel Michelin, estaria esgotado, sem dúvida nenhuma.

Seja como for as capacidades dos dois estádios são pequenas demais para sediar uma meia final e nenhum deles deveria ser utilizado para uma meia final da Heineken Cup. 
De facto se o jogo tivesse sido organizado em França, não teria mais de 50.000 bilhetes por vender. 
Tão forte é a evidência que o que Griffiths deveria ter dito é que Twickenham não é capaz de organizar uma meia final, com pouco tempo de divulgação.

O Clermont Auvergne jogou as meias finais de 2012 e 2013 e em ambas as vezes os jogos foram realizados no interior de França, em lugares longe de Clermont, mas as lotações foram esgotadas. 
O Clermont enfrentou o Leinster frente a 32,397 pessoas em 2012 no estádio Chaban Delmas em Bordéus, e em 2013 o Estádio de la Mosson, em Montpellier ficou lotado com 31,259 pessoas para o jogo contra o Munster. 
Os dois estádios receberam quatro jogos no Campeonato do Mundo de 2007 e também receberam jogos da seleção francesa nos anos a seguir.

Qualquer um dos dois estádios poderia estar esgotado para o Clermont-Saracens e também há várias outras opções em França, incluindo Lyon que é muito mais perto de Clermont. 
Leeds é mais próximo de Londres do que Montpellier é de Clermont mas, mesmo assim, não existe nenhum precedente de ver as autoridades preparando o publico com test matches ou grandes partidas do Aviva Premiership ou da Heineken Cup.

O sucesso dos test matches nos estádios de França teve um efeito super positivo para o rugby profissional no país, tanto que os clubes são capazes de organizar encontros do Top-14 e Heineken Cup nos mesmos estádios do Mundial de 2007 e o ERC também consegue. 

Em outras palavras, todo mundo está ganhando e o Top-14 é cada vez o líder de rugby profissional no mundo. 
Uma abordagem tão visionário está faltando seriamente na Inglaterra, onde vários clubes continuam a assegurar valores amadores, enquanto as cidades grandes estão cada vez mais assumindo o lugar das pequenas cidades no sudoeste da França.

A lição para a Inglaterra é claro - test matches não podem continuar a ser exclusivamente organizados em Twickenham. 
Uma partida por ano tem que ser relocalizada e outros jogos importantes também deveria acontecer fora da capital britânica, incluindo meias finais do Aviva Premiership. 
De facto esta falta de organizar test matches fora de Londres contribuiu significativamente para que o País de Gales receba oito jogos no Mundial, enquanto a metade norte da Inglaterra receberá apenas seis. 
Muitas das maiores cidades da Inglaterra, incluindo Manchester, Leeds e Birmingham não conseguiram nenhum jogo de Tier 1-Tier 1 no Campeonato do Mundo, mas Wembley vai receber o jogo mais importante da Pool C.

Nota da redação
Como curiosidade e para comparação, a seguir se publica uma lista de todos os jogos internacionais de Portugal, realizados em Portugal, fora de Lisboa. Dos 242 jogos realizados por Portugal, 122 foram realizados em Portugal, e desses, 99 tiveram lugar em Lisboa e 23 fora de Lisboa.


7 comentários:

www.rugbyvox.net disse...

Lamento ter de discordar quase totalmente deste artigo. Vou só deixar umas notas breves ao autor.

Wembley é muito mais fácil de encher do que Twickenham. Se os Sarries tivessem Wembley disponível a adesão de adeptos seria muito maior. Não é por acaso que eles organizam geralmente os grandes jogos por lá. É uma questão de acessibilidades. Wembley tem à porta uma estação de comboio e uma de metro, não muito longe mais uma de comboio e de metro. Twickenham tem uma de comboio não muito longe. Wembley tem vários hotéis perto, Twickenham não.

O rugby inglês está muito melhor organizado que o francês, quer ao nível do topo, quer a pirâmide. Os programas comunitários dos clubes de topo são importantes elementos de consolidação regional. O top 14 progrediu porque nele foi investido muito mais dinheiro, estando todos os clubes com défices enormes. A premiership tem tecto de despesa em salários para garantir a solvabilidade da competição, o que não acontece em França, apesar disso, como reconhece Villepreux, joga-se melhor rugby na Premiership do que no Top 14. O top 14 tem perdido espectadores nos últimos anos, ao contrário da Premiership.

O rugby union, em Inglaterra, tem o problema de em nenhum local do país ser o desporto número um, e de sofrer em parte do país forte concorrência do rugby league - o que não acontece em França onde o League está sempre muito atrás do Union em popularidade.

A seleção jogar noutros locais de acordo com os estudos existentes não melhoraria o impacto regional. Por exemplo, jogar em Manchester teria praticamente o mesmo universo de espectadores (as pessoas viriam de outros locais, Manchester é League), segundo o estudo que conheço. E teria muito mais custos, quer para a RFU, quer para os adeptos.

Aliás o perfil médio do espectador inglês é completamente diferente do adepto francês, e até do adepto inglês de futebol.

O rugby inglês está bem e recomenda-se.

Anónimo disse...

Impressionante o facto de não haver jogos da Selecção Senior acima do mondego e a sul do tejo há cerca de década e meia. Realmente em Portugal, Rugby só existe num raio de 100km à volta de Leiria (desde de Lisboa até Coimbra).

Anónimo disse...

Prezado Rugby Vox,

Não existe nenhuma prova para apoiar sua sugestão que Saracens tem jeito de vender 80,000 engressos para um Semi Final em Wembley em apenas quatro semanas.

O Top 14 é profissional e o Aviva Premiership também. Todos os numeros mostram a mesma coisa - França está vencendo e por muito.

O Top 14 não perdeu espectadores nos últimos anos. Ao contrario conquistou mais mas na Inglaterra perdeu.

Todos os clubes de London Irish, London Wasps, Newcastle Falcons, Northampton Saints, Sale Sharks, Saracens and Worcester Warriors estão sofrendo com menos torcedores hoje do que em 2009.

Mas na França Paul Goze (LNR) explicou que hoje o tamanho médio é mais de 15,000 por jogo no Top 14.

Também no Aviva Premiership de 2013-2014 até agora os clubes estão tendo 12,294 pessoas por jogo. Em 2009-2010 foi 13,674!

Fontes: Irish Times, Independent

Luis Canongia Costa disse...

Não referi que os Sarries venderiam 80000 bilhetes na meia-final. Venderiam mais do que venderam para Twickenham. É por isso que os Sarries jogam habitualmente em Wembley e não em Twickenham, apesar do custo de aluguer do Estádio ser superior. Há pelo menos dois estudos nesse sentido (atractividade de Wembley face a Twickenham, para o adepto de rugby). Aliás o adepto de rugby em inglaterra é muito peculiar (e muito diferente do adepro de futebol inglês).

É no minimo demagógico comparar números de 2009-2010 da Premiership com outros anos. 2009-2010 foi um ano anormal, com um total de 1.913.718 bilhetes vendidos pelos clubes. Em 2008-2009 foram 1.507.726, em 2010-2011 1.574.697 e em 2011-2012 1.578.868 .Em 2012-2013, houve uma redução para 1.515.084 espectadores, ano em que se passou a disponibilizar os jogos na internet gratuitamante. Como refere a média está a ultrapassar os 12.000, o que é o segundo melhor resultado dos últimos anos, só ultrapassado pelo ano excepcional de 2009-2010.

Em relação à LNR é a informação que tenho e o que o Goze refere nem sempre é factual. Espero poder dar dados concretos mais tarde.

Anónimo disse...

Muito interessante esta discussão sobre os números dos Saracens, mas o que eu acho mais importante deste texto é a ideia subjacente a ele próprio, e que me parece absolutamente verdade - o rugby inglês tem sido prejudicado pelo centralismo imposto pela RFU.
É óbvio que existe uma má vontade contra o MdM por parte das críticas feitas, pois se atacam os detalhes e nem se fala nas ideias, mas isso é habitual em Portugal - a nossa inveja em relação a quem aborda assuntos que nós não temos coragem de falar.

E é engraçado a facilidade com que o Sr. Luis Costa acusa o autor do texto de demagogia... Afinal é mesmo verdade que houve uma quebra entre 2009 e 2013 nas vendas da Aviva, e um aumento nas vendas da Top-14...

Agora, para mim, o que fica deste texto é que em França é possível ter grandes jogos fora de Paris, e que em Inglaterra não se sai de Londres...

E gostei de saber que em 122 jogos da seleção nacional em Portugal, apenas 23 foram em Lisboa, e que entre 2004 e 2011 não foi nenhum!!!

Luis Canongia Costa disse...

É demagogia usar um ano de vendas de bilheteira anormal para comparar com outros anos. É essa a questão. 2010-2011 sobe em relação a 2008-2009 e 2011-2012 sobe em relação a 2010-2011. Há uma tendência crescente.

Em relação ao Top 14, as vendas de bilhetes na fase regular (dados que usei para a Premiership) foram as seguintes:
2009-2010 - 2.473.159
2010-2011 - 2.554.864
2011-2012 - 2.331.104
2012-2013 - 2.395.404

Ou seja o comportamento de vendas não foi crescente como se apregoa.

Tal como aconteceu este ano na Premiership, também o Top 14 está a ter um comportamento positivo, mas não serão ultrapassados os números de 2010-2011.

O que contesto mais sustentadamente é a ideia de o Top 14 ser melhor que a Premiership.

Também não me parece que em Inglaterra a seleção possa jogar foram de Londres nos grandes jogos. É uma questão financeira, é. Não se consegue encher o Old Trafford com os bilhetes ao mesmo preço de Twickenham. O adepto de rugby prefere Londres a Manchester. O assunto já foi objeto de estudo.

Quando ao centralismo da RFU, referido pelo "anónimo" é não perceber como o rugby inglês funciona. Há centralismo nos jogos da seleção primcipal, não há no resto - por exemplo foram investidos milhões de Libras no apoio ao desenvolvimento de infraestruturas dos clubes por todo o território (só para dar um exemplo).

Em relação ao rugby nacional já muitas vezes referi não haver um verdadeiro projeto de desenvolvimento regional. Não há nunca houve.

Anónimo disse...

Não concordo com esta apreciação que é feita sobre o rugby inglês e sobre as críticas ao facto de a England RFU manter os jogos em Twickenham, contrapondo com exemplos de França.

Então esclareça lá o autor porque é que a Federação Francesa está a construir um estádio próprio?

Para o inaugurar e depois andar a jogar por várias cidades? Ou será porque cada vez que tem de utilizar um estádio (tipo S. Denis) paga um balúrdio em alugueres?