16 de abril de 2015

REGULAMENTOS SÓ DEVEM SER ELABORADOS/ALTERADOS APÓS ANÁLISE CUIDADOSA E EXAUSTIVA

Os recentes acontecimentos que rodearam a pré-eliminatória da fase final da Divisão de Honra vem confirmar que qualquer alteração aos regulamentos federativos deve ser precedida de um estudo cuidado e exaustivo, que evite situações de necessidade de esclarecimento ou interpretação fora de horas, susceptíveis de levantar suspeitas quanto à sua bondade ou à sua orientação.

Vem isto a propósito da alteração que o Regulamento Geral de Competições sofreu em 28 de Junho de 2012, no que diz respeito à atribuição de falta de comparência a uma equipa, alargando o âmbito da sua aplicação quando uma equipa não apresentasse no início de cada jogo um mínimo de 12 jogadores, para quando se verificasse essa circunstância no início ou no decorrer de um jogo.

(Recorde-se aqui que os cartões amarelos e vermelhos foram introduzidos no rugby europeu, a título experimental, no torneio das Seis Nações do ano 2000)

A referida alteração de Junho de 2012 foi feita sem que as suas consequências tivessem sido devidamente ponderadas, levantando a questão de sabermos se houve ou não outras alterações, com origem em decisões da direcção federativa, que tenham sido tomadas da mesma forma leviana - ou que venham a ser tomadas dessa forma!

Assim foi necessário chegarmos a uma situação que exigiu a urgente interpretação desse preceito regulamentar, para que a direcção da FPR - responsável pela referida alteração - fosse obrigada a analisar as consequências dessa modificação, e fizesse da mesma uma interpretação que poderia ter sido tranquila noutras circunstâncias, mas que feita desta forma, sob pressão e na iminência de fazer rebentar uma crise grave no rugby nacional, perdeu credibilidade e levantou suspeitas quanto à sua bondade.

Mais importante do que a medida interpretativa tomada ficou a clara noção de que os regulamentos não devem ficar na exclusiva dependência da direcção da federação, quer na sua elaboração, quer em eventuais alterações, já que se tem provado nos últimos anos que essas medidas são muitas vezes tomadas sem a análise exaustiva dos problemas e antes duma forma leviana e imediatista que tem provocado a necessidade de recorrer à intervenção dos orgãos disciplinares da FPR para a resolução de conflitos em que a própria direcção e suas decisões são parte.

O CASO TÉCNICO-BELENENSES
Este lamentável caso, que teve o seu início com a indisciplinada atitude da equipa do Técnico - custa a entender que uma equipa a vencer por 20 pontos, já em tempo de descontos, num jogo de eliminação directa, se tenha deixado arrastar para actos que provocaram a distribuição de quatro amarelos em poucos minutos - acabou por mostrar a ligeireza com que se regulamenta no âmbito da FPR e a leviandade de uma direcção federativa que age como se os regulamentos fossem coisa que se manipula de acordo com as necessidades, adaptando-se às circunstâncias, e não que devam servir de referência quanto ao funcionamento das competições e quanto às medidas a tomar perante os casos que forem acontecendo.

Da forma como o assunto foi resolvido apenas o Belenenses sai de cabeça erguida, ao recusar formalizar o protesto que tinha anunciado no Boletim do Jogo, evitando o arrastamento de uma situação que envergonha todos os que estão envolvidos com o rugby em Portugal.

Quanto a futuras alterações dos regulamentos - sejam eles do Regulamento Geral ou dos Regulamentos próprios de cada competição - esperemos que haja o bom senso de as fazer discutir amplamente antes de serem postas em prática, promovendo dessa forma a participação de todos os que se interessam por rugby em Portugal.

Em relação ao comunicado da FPR sobre a matéria, que se reproduz no final, estranha-se (ou devia estranhar-se...) a falta de cuidado com que o mesmo foi elaborado, justificando a decisão da direcção da FPR com base num artigo dos Estatutos (Artº 30º) que refere especificamente as competências do Conselho de Justiça quanto a eventuais interpretações dos Estatutos, não se compreendendo ainda porque não foi alargado o âmbito da interpretação, desde logo, ao Artº 39º-1.e) do RGC que trata das Faltas de Comparência, evitando futuras dúvidas e problemas.

Uma redação mais cuidada do texto da deliberação da direcção da FPR - que depois de publicado no Boletim Informativo assume força obrigatória geral - faria com certeza referência a um outro artigo dos mesmos Estatutos, ou melhor, ao próprio Regulamento Geral de Competições que é bem claro quanto à competência sobre as dúvidas de interpretação na sua aplicação.


15-4-2015

Divisão de Honra: Deliberação da Direcção

Foi tomada a seguinte deliberação pela Direcção da FPR, na reunião de dia 14-04-2015:
No jogo dos play-off da Divisão de Honra, realizado no passado dia 11 de Abril, pelas 17:30 horas, no Campo das Olaias, entre a AEIS Técnico e o CF Os Belenenses, a equipa da AEIS Técnico ficou reduzida a onze jogadores, nos minutos finais desse jogo, em consequência da amostragem de quatro cartões amarelos a seus jogadores.
O CF Os Belenenses manifestou a sua não vontade da formalização de qualquer protesto, apesar da intenção manifestada no Boletim do Jogo.
O artigo 36.º do RGC, no número 1, estipula que o número mínimo de jogadores em campo, no XV, é de 12.
No entanto, a regra não estipula se esse número mínimo tem que ser definitivo ou se meramente temporário.
Ora, entende-se que essa exigência tem que ser no sentido definitivo e não meramente temporário, até atentas as consequências previstas nos Regulamentos.
E, no caso, foi manifestamente temporária a ocorrência da presença de onze jogadores em campo por parte da AEIS Técnico, em consequência de quatro cartões amarelos (e não vermelhos).
Assim, e nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 30.º dos Estatutos da FPR, a Direcção delibera que o artigo 36.º, número 1, do RGC deve ser interpretado no sentido de o número mínimo de 12 jogadores em campo por parte de uma equipa tem que o ser de forma definitiva e não meramente temporária.
Mais se reconhece, em consequência, o resultado do jogo em causa e o apuramento da AEIS Técnico para as meias-finais da Divisão de Honra 2014-2015.


Lisboa, 15 de Abril de 2015


Estatutos da FPR
ARTIGO 30º
Competência
1 - Compete ao conselho de justiça:
a) ...;
b) ...;
c) ...;
d) Decidir as dúvidas de interpretação dos estatutos e resolver os casos omissos, neste
caso com sujeição à ratificação da Assembleia Geral;
e) ...;
f) ....


Regulamento Geral de Competições
Artigo 68.º
(Interpretação e integração de lacunas)
1. As dúvidas de interpretação na aplicação deste Regulamento serão resolvidas pela Direcção da FPR, a qual divulgará mediante Comunicado a sua interpretação, a qual se revestirá de força obrigatória geral após publicação em Boletim Informativo...
2. ...

1 comentário:

FCFerreira disse...

Excelente artigo! Absolutamente elucidativo e imparcial.
Tal como tinha referido em anterior comentário, a regra que está no RGC não oferece margem para a interpretação que a Direcção da FPR fez dela. Mas tal como tinha "adivinhado" nesse mesmo comentário, a Direcção da FPR viu-se forçada a uma interpretação "malabarista", atendendo às consequências/danos colaterais que a aplicação correcta da regra teria para o Técnico: eliminação da Taça de Portugal e impedimento de inscrição na Divisão de Honra na próxima época. Seria um exagero, uma injustiça, uma sanção absolutamente desproporcional relativamente ao comportamento do Técnico - 8 minutos de indisciplina "leve" estragariam duas épocas de rugby (esta e a próxima).
Honra seja feita ao Belenenses por ter evitado um grande berbicacho à FPR (sim, à FPR mais do que ao Técnico). Tratou-se de uma decisão "combinada" entre a Direcção da FPR e a Direcção do Belenenses que, antes de ser tomada, foi assumido pelo Belenenses o compromisso de não formalizar o protesto nem recorrer da decisão da Direcção da FPR que "inventaria" uma interpretação à pressão, a fim de se instalar o caos na competição principal do Rugby Português (se a regra tivesse sido correctamente aplicada, sabe-se lá em que data é que se jogariam as meias-finais e a final).
Não sei se todos os clubes da Divisão de Honra teriam tido a postura do Belenenses... Quero acreditar que sim!
Em suma, nesta história toda só existe uma entidade que meteu os pés pelas mãos. E não foi o Belenenses, nem o Técnico, nem o árbitro..