18 de outubro de 2013

GEÓRGIA MOSTRA COMO AVANÇAR DO TIER-3 PARA O TIER 2


* Paul Tait
A ex-república soviética da Geórgia está mostrando a outros países o caminho para o desenvolvimento do Rugby. 

O país participou em três Campeonatos do Mundo de Rugby consecutivos e tem evoluído cada vez mais, e para 2015 o país está próximo de se classificar novamente como Europa 1.

A equipa já não é mais uma equipe do Tier-3, conseguindo derrotar selecções do Tier-2 e ainda dificultando a vida de adversários do Tier-1. 

Com dez anos passados desde quando os Lelos fizeram sua estreia no grande palco a selecção tem mostrado o que é possível realizar quando os jogadores actuam regularmente em clubes de nível superior e internacional. 
Do plantel da Geórgia do mundial de 2011, entre os 30 que competiram, 23 jogavam na França. 
A maioria em divisões inferiores francesas, mas nove no poderoso Top 14, como Mamuka Gorgodze, Goderdzi Shvelidze e Davit Zirakashvili. 

No total, existem actualmente mais de 60 georgianos jogando na França esta temporada, 12 deles na Top-14 - mais do que a Roménia, a Itália e até o Canadá.

A participação em nível internacional da Geórgia no Campeonato Europeu de Nações (ENC) garante aos Lelos realizar partidas anuais contra equipas com experiência em Mundiais de Rugby, incluindo Portugal, Roménia, Rússia e Espanha. 
O torneio tem possibilitado aos Lelos testar um grupo diversificado de jogadores, em condições adequadas. 
Ultimamente a Geórgia pôde realizar experiências em campo, nos jogos contra a Alemanha, Bélgica e a Ucrânia, seus oponentes mais fracos. 
Isso tem funcionado bem, e a Geórgia tem sido regularmente a melhor equipa da ENC desde o Campeonato do Mundo de 2007.

O que a Geórgia tem é, em outras palavras, um ambiente ideal para o Tier-2 tentando se estabilizar e seguir em frente para ser capaz de competir com o Tier-1. 
Coisas semelhantes podem funcionar bem se aplicadas em outros lugares, já que a Geórgia tem progredido significativamente mesmo não possuindo uma estrutura doméstica profissional. 

Como na Argentina, foi a exposição de jogadores nas ligas profissionais da Europa Ocidental, que fez a maior diferença. 

A diferença entre a Argentina e a Geórgia diminuiu significativamente, mas hoje a Geórgia está mais perto do nível da Itália do que do nível da Espanha ou Uruguai.

Canadá e os EUA poderiam ter um progresso semelhante, apesar de ambos ainda não serem capazes de derrotar equipes que compõem o Torneio das Seis Nações e do Rugby Championship. 
Ambas as equipes têm a sua quota de jogadores de qualidade distribuídos em clubes profissionais na Inglaterra, França, Japão, Escócia e País de Gales, mas, apesar de quase metade do seu XV ser profissional, a maior parte são amadores com base na América do Norte.

A Geórgia estreou-se no Mundial 2003, enfrentando Inglaterra, Samoa, África do Sul e Uruguai. 
Os europeus do leste não ganharam nenhum jogo e não deram trabalho algum para três dos quatro adversários. 
O primeiro jogo dos Lelos foi em Perth contra a Inglaterra, com os campeões daquele ano vencendo por 84-6. 
Quatro dias depois Samoa venceu-os por 46-9. 
A Geórgia, no entanto, sujeitou a África do Sul uma partida muito física e apesar de perder de 46-19, os europeus deixaram uma boa impressão. 
Os Springboks foram incapazes de fazer valer os seus padrões habituais e assim a Geórgia mostrou-se superior às expectativas criadas na época. 
Por último veio o Uruguai e apesar da paixão dos sul-americanos como factor decisivo, os Teros ganharam por 24-12.

Quatro anos depois, no Mundial 2007, a Geórgia tinha um grupo ainda mais difícil
com Argentina, Irlanda, Namíbia e França. 
O confronto contra os africanos era visto como o único jogo viável, enquanto os outros três foram abordados como sendo nada mais nada além de um treino contra adversários do Tier-1. 
A Geórgia marcou um ensaio contra a Argentina no primeiro tempo antes dos Pumas marcarem quatro no segundo período para ganharem confortavelmente. 
Quatro dias depois a Geórgia quase fez o impossível contra a Irlanda e chegou muito perto de ganhar a partida que terminou em 14-10. 
Os Lelos em seguida, se mostraram bons demais para a Namíbia ao ganhar por 30-0 antes de perder por larga vantagem (64-7) contra os franceses, em Marselha, na despedida.
O resultado contra a Irlanda foi um alerta para a Ilha Esmeralda e também mostrou o quanto a Geórgia tinha sido capaz de melhorar num período de apenas quatro anos. 

Em 2011, os Lelos foram ainda melhores, apesar de ter caído no grupo da morte, como em 2007. 
A Geórgia enfrentou Escócia, Inglaterra, Roménia e Argentina. 
A extensão do progresso georgiano pode ser visto na ausência de ensaios concedidos à Escócia e à Roménia, enquanto a Argentina teve de forçar no final para marcar três ensaios, ficando sem o ponto bónus ofensivo (dado para quem marca quatro ensaios ou mais). 
A Inglaterra marcou seis ensaios aos Lelos, mas a reacção foi tardia e a pontuação inglesa foi a metade daquela do Mundial de 2003.

Tais melhorias em campo ocorreram apesar da Geórgia não ter nenhuma notável infraestrutura nacional de rugby. 
O rugby que existe dentro do país é, certamente, significativamente inferior a outros do Tier-2, como Canadá, Japão, Roménia e EUA. 
A maneira pela qual a Geórgia se desenvolveu é um caminho que os outros devem percorrer. 
A exposição a um nível superior ou até mesmo às quartas ou quintas divisões do rugby francês tem criado um quadro melhor para os georgianos em relação ao que se passava há dez anos.

A capacidade adquirida pela Geórgia de competir seriamente contra equipas mais avançados fez com que os Lelos substituíssem a Roménia como os melhores europeus fora do Torneio das Seis Nações, e também criou a expectativa da Geórgia continuar melhorando e tornar-se mesmo uma equipe de Tier-1. 
Isso talvez aconteça daqui a dois anos: com um sorteio favorável a Geórgia pode muito bem não só obter duas vitórias nos jogos de grupo do Mundial 2015, mas até mesmo lutar por uma vaga nos quartos-de-final. 
Se a Geórgia for apurada como Europa 1 enfrentará Tonga e África 1 além dos All Blacks e Pumas. 
Com certeza é um sorteio favorável.

Fotos: www.esporte.uol.com.br e www.forumchaves.com.br

6 comentários:

Great_Duke disse...

Olá Paul,

Em comparação com Portugal há um facto muitíssimo relevante.

Os jogadores portugueses não querem (em regra) ser profissionais de rugby porque são, em grande maioria, universitários que esperam uma carreira jurídica, médica, de engenharia ou parecido.

Os georgianos vêm o rugby como uma grande oportunidade na vida deles.

Esta diferença faz com que seja muito mais difícil um jogador português querer emigrar...

Anónimo disse...

Creio que a sua análise esta correctíssima. É apenas a jogar com os melhores que os jovens jogadores podem evoluir. Nesse sentido, a exposição dos nossos jovens talentos à pressão e ritmo competitivo da Amlin Cup só pode trazer benefícios a longo prazo. E reafirmo o "longo prazo"; Não se esperem resultados imediatos, nem que ganhemos um jogo tão cedo....mas os nbenefícios hão-de surgir. É uma das poucas medidas que Portugal pode tomar, juntamente com a continuada aposta nas competições "Age Grade" da Fira e da Irb.
No que não vamos nunca conseguir seguir a Geórgia é na "exportação" de jovens jogadores para ligas europeias mais desenvolvidas. O nível sócio-económico médio do jogador de rugby Português joga contra este objectivo. Por exemplo enquanto uma possível carreira no rugby profissional em França, numa equipa da 2ª ou 3ª divisão, relativamente mal paga e sem garantias de futuro pode ser atractivo para o filho de um camponês dos confins da Georgia, já não o é para os pais de um jovem urbano de classe média/média alta que consstitui ainda o "backbone" dos jogadores de elite portugueses. Tanto eles como os pais querem é que ele tire um curso e tenha um emprego "normal". É uma questão sócio-cultural. E não vejo o que possamos fazer a esse respeito enquanto os clubes de fora das grandes cidades crescerem ao ponto de poderem fornecer regularmente quantidades significativas de atletas para as academias e as selecções.

Anónimo disse...

O Rugby de Portugal tem de crescer internamente, até pela razão exposta no primeiro comentário

Anónimo disse...

É bastante claro que se Portugal não apostar na formação e exportação de jogadores para campeonatos profissionais lá fora, o nível da seleção acabará inevitavelmente por descer. Será impossivel competir com Países que cada vez mais têm campeonatos profissionais e/ou simultaneamente exportam jogadores como os nossos adversarios no ENC.

Como Portugal não tem nem pode ter um campeonato profissional e como não exporta jogadores não estou a ver como é será possivel não ficarmos para trás...

Great_duke disse...

Pois...por isso é que é tão importante alargar o rugby a todo o país e a todos os extractos sociais.

Por isso é que o élan de 2007 foi/devia ter sido tão importante para o nosso futuro...

Se o rugby não se democratizar (o que já esta a acontecer mas sobretudo em Lisboa) e não se descentralizar, nunca conseguiremos acompanhar os georgianos, russos e romenos...

Temos duas vias que não são necessariamente opostas:
- aumentar a nossa qualidade interna e
- exportar jogadores.

Pelas razões expostas noutras mensagens (incluindo a minha) só apostando no desenvolvimento é que conseguiremos uma ou as duas vias.

Anónimo disse...

Não tenho informação suficiente para poder concordar ou discordar com os comentários expostos. Mas reconheço serem pertinentes, por isso, identifico-me com eles.

Um ponto que chamou mais atenção, é a questão socio-cultural relativamente à perspectiva de futuro para um atleta português.

Creio que não será só no rugby, mas a nossa sociedade tem de mudar no seguinte aspecto: começar uma nova carreira profissional aos 35 ou 40 anos porque se teve uma carreira anterior de atleta profissional de uma dada modalidade durante os 15 anos anteriores, tem de deixar de ser tabu. Isto é, empresários, educadores, a família, e o estado, devem olhar para o CV de um ex-atleta profissional e ver alguém com experiência profissional anterior em mudança de carreira, e não como alguém que andou a repetir anos de escola enquanto se divertia a jogar e anda à procura de 1º emprego. Desculpem a rudeza das minhas palavras, mas é este o raciocínio na cabeça de muita boa gente. Já há muito tempo que se fala que um emprego para a vida toda é coisa do passado. Que o normal é uma pessoa ter vários trabalhos/ocupações ao longo da sua vida activa. Então porque ser-se atleta profissional não pode fazer parte desse percurso? Se se foi 8 anos militar contratado, eventualmente com missões no estrangeiro, porque não se pode ter sido 15 anos atleta, eventualmente a trabalhar (foi de propósito que não coloquei "jogar" e "competir") no estrangeiro?

Isto teria algumas vantagens. Uma já foi referida: facilitaria a saída de atletas (atenção, não confundir com o apelo à emigração feito noutros contextos) com todas as vantagens já referidas nos outros comentários.

Outra é que a perspectiva de um rendimento futuro após a vida de atleta, iria reajustar os níveis salariais permitindo que mais clubes pudessem pagar e mais atletas pudesse aceder ao profissionalismo. Isto é, diminuir alguma ansiedade em ganhar dinheiro porque depois é o fim, nos casos em que exista essa ansiedade. Senão o que temos é alguns atletas que ganham rios de dinheiro só possível a alguns clubes, e outros com salários em atraso. Isto enquadrado em termos fiscais, contagens de tempos de serviço, segurança social e reforma.

Mas o atleta tem de fazer a sua parte, nomeadamente preparando-se para a mudança de carreira. A sua instrução superior ou técnica ou profissional, eventualmente em instituições do pais em que esteja a jogar (o que implica o aprofundar o reconhecimento entre instituições de ensino), tem de ser um aspecto a considerar, com um grau de crescente de importância à medida que a carreira de atleta profissional se aproxima do final. Além disso tem de "preparar a sua cabeça".

Saudações,