31 de janeiro de 2017

DESENVOLVIMENTO, COMPETIÇÕES E SELEÇÃO NACIONAL *

Temas de fulcral importância para o rugby nacional, o desenvolvimento e as competições são as pedras de toque do crescimento e da saúde de um desporto numa sociedade.

António Guilherme Vidigal foi presidente do Caldas Rugby Clube durante 18 anos, depois de ter sido diretor da secção de rugby do Caldas Sport Clube por três anos, cargo que abandonou quando, com mais dois amigos, resolveu fundar em 1998 o atual clube de rugby das Caldas da Rainha, e embora esteja afastado de funções diretivas neste momento, continua atento e preocupado com a situação do nosso rugby, dando-nos aqui a sua visão sobre o momento que vivemos no rugby nacional.
* António Guilherme Vidigal
A 23 de Setembro, a FPR envia aos clubes um comunicado, com um conjunto de considerações que no seu entender justificam uma profunda alteração dos modelos competitivos e da organização das competições seniores em Portugal.

Mais uma vez se acredita que a melhoria do Rugby Nacional se resolve alterando modelos competitivos. Profundamente errado. Essas tentativas já ocorreram no passado e, agora, somente se pretende resolver a vida aos pseudo principais clubes, vulgo clubes de Lisboa, que se confrontam com excesso de atletas.

Como sempre defendi, a solução para o Rugby Nacional passa pelo alargamento exponencial da base, com a expansão massiva do nº de atletas nos clubes.

Para isso é necessário ir para o terreno. A FPR, se quer fazer algo positivo, tem que pôr os seus técnicos a trabalhar directamente com os clubes. Tirá-los dos gabinetes e secretárias e pô-los a trabalhar no desenvolvimento, com os clubes fora dos grandes centros. Assim se combaterão as assimetrias.

Em qualquer modalidade e competição existem desequilíbrios, maiores ou menores, entre os diferentes participantes. Não é pela redução do nº de participantes que se melhoram globalmente e de forma estruturada os níveis da competição. Antes, assegurando ferramentas e meios aos menos desenvolvidos para se aproximarem dos restantes.

Das diversas considerações com que a FPR se tenta justificar para alterar os modelos competitivos, uma chega a revelar-se ofensiva e discriminatória para com os clubes da periferia/província. A questão geográfica. Se 70% do rugby se encontra na região de Lisboa, a culpa é da FPR, que ao longo dos anos e de várias direcções, pouco tem feito para inverter essa situação. Vir agora agitar essa bandeira como motivo para alterar os modelos, beneficiando claramente esses 70%, é ofensivo e discriminatório para com os restantes clubes. A obrigação é inverter essa tendência e não incrementá-la, o que está claramente implícito nesta proposta.

Vem também a FPR nesta proposta referir a necessidade de implementar modelos regionais de competição, como forma de incrementar o desenvolvimento regional. Mas esses modelos já existem! Não há necessidade de implementar e inventar nada de novo. Já temos o Camp. Nacional da II Divisão e o T. N. Emergentes. O que é necessário é respeitá-los, dar-lhes o valor e reconhecimento que necessitam, acarinhá-los. Apoiando os clubes, colaborando com os clubes.

Os actuais modelos servem perfeitamente à nossa realidade. O trabalho da FPR tem que ser a aposta no Desenvolvimento Regional e no desenvolvimento da base da pirâmide. Reduzir as assimetrias. Incentivar e apoiar o crescimento dos clubes da periferia. Impulsionar e exponenciar o crescimento do número de atletas em todos os clubes, em especial os fora dos 70%.

Campeonatos Nacionais de 15 de Setembro a 31 de Janeiro???

Esqueceram-se que isto é amador? Com férias em Agosto, quem é que está apto a iniciar uma competição a 15 de Setembro?

E fim a 31 de Janeiro? Será que desconhecem que uma elevadíssima percentagem de jogadores seniores é estudante universitário? Com provas académicas em Janeiro e Fevereiro.

E vamos deixar a decisão das competições para uma época do ano em que os atletas (amadores) têm importantes compromissos pessoais?

E depois de 31 de Janeiro??? Vazio! Nada durante 2 meses. Férias outra vez.

E a 1 de Abril (não é mentira) começa a 2ª época do ano. Mas só para alguns. O Top4 e as Super Regiões sub23. E os outros? TEN’s? E isso é o quê? Os clubes querem jogar isso? Os atletas querem jogar isso?

Com o modelo agora (Setembro) apresentado, apesar de se verificar a existência de muita actividade ao longo do ano, constata-se uma redução significativa da actividade dos clubes. Os C.N. reduzem-se. De uma actividade actual dos clubes e atletas de 7/8 meses (rugby XV), pretende-se passar para 5 meses!!! O que vão fazer nos restantes 7 meses?

A meio da época inventa-se uma competição (Top 4) para os melhores. E os outros? Vão para a bancada assistir? O que vai ganhar o RUGBY NACIONAL com isto, quando 16 clubes e seus atletas vão ficar parados?

Vamos assistir ao esvaziamento progressivo dos clubes, causado pela falta de competições e de actividade dos seus atletas.

Sendo o rugby uma modalidade em que a captação e permanência de novos atletas é uma tarefa muito dura, a FPR vem dar uma ajudinha, ao complicar mais essa tarefa aos clubes que já vivem essa dificuldade. Sobretudo aqueles que não estão dentro dos 70%.

Quaisquer competições que a FPR queira introduzir, com o objectivo de dar mais competição ao grupo dos excelentes, não pode ser à custa das competições existentes e que têm uma regularidade fundamental ao longo de 2/3 do ano.

A competição Top4 e Super Regiões sub23 são excelentes ideias, mas terão que ocorrer em paralelo com as competições actuais e não substitui-las. Os clubes principais têm um problema com excesso de atletas. Usem-nos nestas competições. Não se pode é reduzir o que existe, parar centenas de atletas, para que meia dúzia de privilegiados tenham uma competição exclusiva.

Já para não referir o estrangulamento que este tipo de organização competitiva vai provocar no desenvolvimento e detecção de potenciais atletas de Alto Rendimento. Pois vai ficar restringido aos que nela participarem. Ou seja, vai-se aprofundar e incentivar a subversão do sistema, com o desvio dos melhores atletas de todos os clubes para os do TOP4, caso queiram ter qualquer hipótese de chegar às selecções nacionais. Ao invés de se lhes dar as melhores condições para se desenvolverem nos seus clubes de origem. Teremos como consequência a perda de qualidade e do nível competitivo dos clubes que perderem os seus melhores. Muito positivo para o Rugby Nacional!!!

Para além disso e pensando em Selecções Nacionais, a máxima qualidade possível só é conseguida quando o universo de escolhas é vasto. A redução das competições de topo reduz o número de clubes participantes e, consequentemente, o número de atletas a jogar a um nível elevado, resultando na redução do número de atletas potenciais para o Alto Rendimento.

Ligar os resultados da selecção à duração das competições internas, é demasiado simplista, para não dizer que existe alguma má-fé.

E a maior ou menor participação de luso-descendentes?
De jogadores nacionalizados?
De jogadores a jogar no estrangeiro? Não tem influência?

Seguramente muito mais do que a duração das competições.

Independentemente de se melhorar o nível das competições internas e que não passa pela redução das suas divisões e o encurtamento das suas provas, o que as nossas Selecções Nacionais necessitam é de utilizar os melhores dos melhores. Residentes ou não. Naturais ou não.

Quando competimos com países em que a maioria das suas provas e dos seus jogadores são profissionais, não podemos ter a ilusão que reduzindo as nossas competições amadoras, vamos dar a competitividade necessária aos nossos atletas de topo (amadores) para jogarem contra os profissionais.

A FPR necessita repensar toda a sua estratégia de médio e longo prazo para as selecções nacionais, não só recorrendo a não residentes e não naturais, como todas as principais selecções fazem, como cultivando a exportação de atletas nacionais, incentivando-os, permitindo que compitam em ambientes altamente profissionais e competitivos, bastante mais competitivos que as nossas provas nacionais, junto dos melhores.

Com o actual panorama de desenvolvimento, com um universo reduzidíssimo de atletas, por comparação com os nossos principais rivais, não temos, nem nunca teremos competições adequadas ao que necessitamos para a nossa selecção nacional. Deixemos de inventar modelos competitivos e novas organizações de provas, com a ilusão de nos aproximarmos dos da frente. Essas competições já existem! Lá fora. Levemos para lá os nossos atletas. Copiemos os bons exemplos, em vez de continuarmos a reinventar o que já foi feito por direcções anteriores. Isso também vai obrigar os clubes a procurarem e a formarem novos atletas, para substituírem os que forem jogar no exterior.

É com enorme apreensão que se olha para esta proposta e que, caso os clubes não olhem seriamente para ela, a analisem, a avaliem, pode conduzir a breve prazo ao encerramento de muitos deles. Pelo abandono dos atletas.

E ainda só estamos a falar do que está pensado para os seniores.

1 comentário:

Duarte disse...

A convocatória espanhola para o jogo contra a Rússia é fortíssima. Dos 23 convocados, 16 jogam em França.