11 de março de 2021

RUGBY, UM DESPORTO PARA TODOS - GUILHERME CUSTÓDIO, UM EXEMPLO!!

Um dia, numa ida a uma grande superfície comercial para surpresa de todos, de um cesto cheio de bolas, Guilherme escolheu uma bola oval, e sem saber, deu assim o primeiro passo para aquela que se ia tornar a sua grande paixão, o Rugby!*

Foi por acaso que me deparei com a história do Guilherme, numa referência a uma visita que ele fez a Gloucester e ao seu clube de rugby - que também conheci nos anos 80 e que estiveram em Portugal (no Lisboa Sevens) em 1990 - e me interessei pela sua história.
Aqui deixo hoje, pelo punho de Carlos Carta Custódio, seu pai, a história dessa viagem a Inglaterra e a (ao) Gloucester.
"Passados três anos venho dar a conhecer uma viagem que fiz com o meu filho Guilherme, e tentar fazer também um balanço da mesma.
O Gui joga rugby (é talonador!), na formação do Sporting Clube de Portugal, desde 2012, um dos pioneiros, começou nos U10, e vai nos U18 ... e é surdo.
Apesar da surdez bilateral profunda que o acompanha desde que nasceu, ele não deixa que essa surdez o defina, ele é um jogador de rugby, surdo.

Há anos que ele tinha o sonho de conhecer outros jogadores que fossem surdos, e travamos
conhecimento com um antigo internacional inglês pela England Deaf, Matthew Gilbert. Foi jogador profissional, jogou no Modigliano de Itália, e no Worcester Warriors, bem como no Llanelli Scarlets.

Após avanços e recuos, e depois de muita insistência do nosso amigo Manuel de Mascarenhas Gaivão (aka Alqateia do Luxemburgo), fiz um crowdfunding com o objectivo do Gui ir a Inglaterra e treinar com o Mat Gilbert.

Diz-se que o rugby é uma família e isso é verdade, tivemos muitos amigos nossos a empurrar a mellée, muitos desconhecidos, e outros que só por ajudar a partilhar, deram ainda mais visibilidade à nossa campanha de crowdfunding, caso de M.B.E. Sir Nigel Owen.
Assim que pudemos, arrumamos as nossas coisas todas, roupa quente, fatos de treino, e botas, e a uma quinta-feira, 01 de Março de 2018, embarcamos na British Airways em direção a Heathrow.

Assim que chegamos, sentimos ser o rugby a Alma da Britânia. Eram campos gelados de rugby, uns a seguir aos outros, ao longo da M5.
No autocarro, uma das publicações que estavam ao nosso dispor tinha uma secção só de rugby, enfim... Para quem o mundo é oval, o Paraíso.
No dia seguinte, sexta-feira, fomos até ao Hartpury College, onde joga o Mat Gilbert. Com muita pena nossa, não foi possível treinar com ele, mas estivemos a falar com ele, e deu ainda importantes dicas e truques ao Gui, que ele aproveitou e ainda aproveita hoje para melhorar o seu jogo.

Conhecemos também o Performance Chef do Gloucester RFC, o português Guilherme Longle de Carvalho, que nos acolheu e tratou como VIP.
Vimos os espaços de treino do Gloucester, e tomamos conhecimento de um clube de rugby centenário, enorme. Os balneários, as salas de fisioterapia, o ginásio...
Mas o melhor estava guardado para o fim, um convite para assistir ao Gloucester RFC vs Newcastle Falcons, no dia seguinte, sábado.

Voltando a Gloucester nesse dia, visitamos a Catedral de Gloucester, palco das filmagens dos filmes da série Harry Potter, o que deu para imbuir ainda mais magia nesta viagem.

No sábado, dia de jogo. Gloucester vs Falcons.
Um estádio à inglesa, quadrado, com duas bancadas míticas, a The Stand, onde se assiste de pé ao jogo e The Shed, com os bares sempre a todo o vapor.
Após o aquecimento, começamos a sentir o ambiente do Kingsholm, Stronghold of Cherry & Whites, 9000 pessoas a gritar "Gloooosteeer Gloooosteeer Gloooosteeer" arrepia. E sei que em Portugal estamos a milhas disto, mas que falta que nos faz um estádio destes...
Após o jogo, fomos à terceira parte com as equipas. 
O convívio com John Afoa, Ludlow e com o treinador Ackerman, não desviaram o Guilherme do jogo que se passava no campo, entre a equipa feminina do Gloucester-Hartpury e o Harlequins.

Os outros dois dias seguintes foram de descontração e compra de lembranças, numa loja dedicada ao rugby e já com mais de 100 anos.
No último dia, ficou guardado para uma visita ao Gloucester Deaf Center, onde o Gui fez amigos e deu a conhecer a sua cultura e a Língua Gestual Portuguesa.

Desta viagem ficaram experiências e vontades, e contatos. Muitos.
Uns a esperar que a pandemia passe, pois treinar com o England Expats Deaf não é para todos, e outros a esperar melhores dias, como a vontade de haver mais jogadores surdos, de formação e outros, trazer cá treinadores e equipas de Deaf Rugby (Wales Deaf Rugby, era um sonho… mas possível…), e tentar dar a estes nossos jogadores experiência de jogos internacionais, e presenças em clubes europeus e jogos em Europeus e Mundiais de Deaf Rugby.

Temos muito a agradecer e a muitos, e a todos o nosso muito obrigado.
Podem ter a certeza que estamos a cuidar do que juntos semeamos... e mais tarde, espero que outros possam colher e saborear esses frutos.*

4 comentários:

Carlos Dores disse...

Foi com bastante curiosidade e interesse que li esta bonita e exemplar história. Ao lê-la 2 questões me surgiram:
1 - não sendo a minha cor clubistica, que importância terá o SCP neste evento? Poderá ser um exemplo a seguir por outros emblemas?
2 - quantos clubes em Portugal têm um Perfomance Chef? Qual a sua importância no processo?

Carlos Dores

Carlos Carta disse...

Boa tarde caro Carlos Dores.

- 1. O Sporting Clube de Portugal, neste evento apenas contou como elemento agregador, pois houve muitos sportinguistas a ajudar. No entanto a maioria dos apoios surgiram da comunidade oval, no seu todo.
O meu Gui está-lhe eternamente grato.

Como Instituição, o Sporting Clube de Portugal nada teve a ver com o mesmo evento.

- 2. Haverá decerto vários clubes desportivos com um Performance Chef, mas julgo que não no rugby.
Aliás, na Seleção Nacional de Futebol havia sempre um Chef a mandar cá para fora o que os meninos iam jantar, se bem se lembra.
A importância de um Performance Chef num clube desportivo é muita, e no rugby também, claro.
Pois a alimentação é adequada a cada jogador, e à forma do mesmo, se tem que ganhar ou perder peso, se está lesionado, ou a recuperar de lesão, etc.
Digamos que a diferença será a como uma roupa, comida de Autor, de griffe vs a comida prêt-a-porter, fast-food.

Obrigado pelas suas palavras.
Carlos

Carlos Carta disse...


Boa tarde caro Carlos Dores.

O Sporting Clube de Portugal, como intituição, nada teve a ver com esta inciativa, somente é o Clube onde o meu filho joga. Não sei se haverá assim tantos jogadores surdos, eu ando a tentar indentificar alguns, para depois tentar fazer formação dos mesmos, e dar-lhes oportunidade de competir ao mais alto nível, bem como haver formação de treinadores e árbitros (o meu filho, que por vezes apita uns jogos, está referenciado para futuramente apitar Deaf Rugby).

No rugby, não deve haver, mas no futebol, e nos maoires clubes desportivos acho que sim, haverá Performance Chef.
Esse profissioanl pode ajudar muito na performance de um atleta, pois ele pode adequar a alimentação ao seu estado físico, ou até ao recuperar de lesões, etc.

Grande abraço,
Carlos

Carlos Dores disse...

Caro Carlos Carta
Grato pelos seus esclarecimentos. O futebol, no âmbito desportivo, acaba por obter os maiores e melhores patrocínios pela indústria em que se transformou. Mas cada vez há mais exemplos de superação!
Coloquei a questão do SCP porque deduzi haver uma real aposta na formação, inclusivé no futebol. O exemplo do Guilherme poderia ser mais um em como apostar na formação deveria ser imperativo. Subentendi que era o caso, pois presumo (não sei se bem!) que a nova direcção do clube deu ênfase a uma estrutura e apoio à formação.
Por outro lado, menciono a questão do Performance Chef por ser meu entendimento que, estas novas dinâmicas, fazem toda a diferença. Quando joguei estes desenvolvimentos ainda não eram conhecidos, mas, reconheço, que teriam sido muito importantes se tivessem sido aplicados.

Por agora é o que se me oferece. Grande abraço Carlos e força Gui!